OS PERIGOS DAS REDES SOCIAIS
OS PERIGOS DAS REDES SOCIAIS
Campanhas de ódio, assédios, exposição da intimidade alheia e até tentativa de homicídio usando a internet como meio de aproximação são riscos enfrentados com frequência cada vez maior pelos internautas
A internet e as redes sociais criaram um espaço infinito para a livre circulação de ideias e opiniões. Como consequência, nesse território são instalados tribunais instantâneos que elevam ou enterram as reputações de celebridades e gente comum sem a menor piedade. Nesse meio é possível ter acesso aos mais brilhantes pensadores e conhecer gente bacana para, no clique seguinte, entrar na mira do pior dos criminosos ou ser vítima do mais insuspeito mau-caráter. Há notícias falsas, mentiras políticas, campanhas de ódio, constrangimentos públicos, agressões verbais, preconceitos, assédios, exposições de intimidade e até tentativa de homicídio usando os canais para aproximação com a vítima.
No caso de repercussão recente mais grave, Elaine Caparróz por pouco não foi assassinada em seu apartamento, no Rio de Janeiro, na madrugada do domingo 17. Há oito meses ela trocava mensagens de texto e voz por rede social com Vinícius Serra. O que deveria ser um primeiro encontro se tornou um espancamento de quatro horas. Mãe do lutador de jiu-jitsu Rayron Gracie, ela tinha noções de defesa pessoal, evitando ser estrangulada mesmo ferida. Pior destino teve Fabiane Maria de Jesus, morta por linchamento em 2014 no Guarujá, em São Paulo. Ela foi confundida com uma sequestradora que agiria na cidade e que teve o retrato divulgado no Facebook. Dias depois, foi descoberto que nem sequer a suspeita era ligada ao caso. Cinco pessoas foram presas.
Distantes entre si no tempo e no espaço, esses crimes brutais tiveram como ponto comum o uso de redes sociais para atingir mulheres. Estimativas apontam que elas são vítimas de 70% dos ataques nas redes. Celebridades também acabam sendo alvos involuntários. Este mês a atriz Marina Ruy Barbosa se viu envolvida como pivô da separação entre os colegas de profissão José Loreto e Débora Nascimento. Casada, Marina foi transformada em destruidora do lar alheio. Loreto foi mantido relativamente incólume pela inquisição da opinião pública. Já a atleta dos salto ornamentais Ingrid Oliveira passou por um linchamento moral mais intenso e que ainda prossegue. Nos Jogos Olímpicos de 2016, foi divulgado que ela levou para seu quarto o canoísta Pepê Gonçalves, que saiu com fama de “pegador”. Atacada, Ingrid teve sua carreira prejudicada e hoje está sem patrocínio. Marina e Ingrid são vítimas de “slut-shaming”, que consiste em humilhar, expor e culpar publicamente mulheres por suas atitudes, sexuais ou não.
A falta de empatia dos insensíveis virtuais não perdoa. Na cerimônia do Oscar deste ano, Olmo, o filho adolescente autista do diretor mexicano Alfonso Cuarón, foi alvo de trollagem, comentários maldosos e gozações em massa nas redes. Os trolls cessaram após críticas e alertas. Uma sorte que não teve o ator Fábio Assunção. Dependente químico, ele foi filmado em um supermercado visivelmente alterado. A trollagem com ele foi tão pesada que seu rosto virou máscara carnavalesca.
A incapacidade de respeitar o outro nas redes começa finalmente a trazer consequências para quem acredita que pode pregar desprezo e sair incólume. Em janeiro, em São Paulo, o estudante de Direito Pedro Baleotti foi expulso da faculdade após publicar um vídeo em que dizia que “essa negraiada vai morrer, vai morrer”. Ele também foi indiciado por racismo e perdeu o emprego.
Outra questão complicada inerente às redes sociais é a proliferação das fake news. Em um ambiente em que ninguém é responsável por nada, elas se multiplicam, especialmente no campo político, onde a manipulação da informação é feita de forma a encaixar o discurso dentro do que quer ouvir o público-alvo. Uma das informações falsas mais difundidas durante as eleições presidenciais de 2018 foi o "kit gay". Na verdade, trata-se de um projeto chamado Escola Sem Homofobia, que o Ministério da Educação, então sob a gestão de Fernando Haddad, apresentou em 2011 com o apoio de diversas ONGs, mas não chegou a ser implantado. O objetivo do “kit gay”, como foi apelidado por seus detratores, seria oferecer formação aos professores para lidarem com os direitos LGTB, a luta contra a violência e os preconceitos e o respeito à diversidade entre os jovens e adolescentes. De forma alguma propunha “sexualizar as crianças” e “ensinar a ideologia de gênero nas escolas do Brasil”. Mas não é só de política que vive a fake news. Muitos casos citados acima, como o da mulher linchada no Guarujá, iniciaram-se a partir de notícias falsas postadas na rede.
Em última instância, vale a crítica ácida de Umberto Eco sobre o barulho das redes sociais: “Deram o direito à fala a legiões de imbecis que, antes, falavam só no bar, depois de uma taça de vinho, sem causar dano à coletividade. Diziam imediatamente a eles para calar a boca, enquanto agora eles têm o mesmo direito à fala que um ganhador do Prêmio Nobel”.
TEXTO ADAPTADO DE:
VARGAS, André. Os perigos das redes sociais. Disponível em: https://istoe.com.br/os-perigos-das-redes-sociais/. Acesso em: 30 de abril de 2019.
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